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Sunday, February 15, 2009
Saturday, February 14, 2009
PAGA O JUSTO PELOS PECADORES o caso da brasileira de Zurique
Este dito popular me veio a mente quando soube do incidente com a brasileira em Zurique. Por todo país, as fotos do ataque provocaram reações de indignação nos brasileiros,principalmente pelo fato da vítima - ao contrário de muitos brasileiros que vivem em outros países – estar em situação legal, trabalhando como advogada de uma multinacional.
Como vivi em vários países estrangeiros, inclusive na Suíça, onde casei, trabalhei e tenho amigos que sempre visito, compartilho do sentimento nacional, apenas com uma visão mais objetiva do caso.
Morar num país cujo IDH está entre os 10 melhores do mundo é uma experiência marcante. Vou sempre a Zurique, conheço aquela estação de trem; conheço as cidadezinhas ao redor do lago; conheço muitos brasileiros que moram lá... Em Zurique, na sede da FIFA, será organizada a copa que os brasileiros tanto esperam. Para ali foi levado o único menino sobrevivente da chacina da Candelária que virou cidadão suiço. Foi num orfanato do Brasil que minha amiga suíça encontrou o menino negro de 6 anos que, recém-nascido, foi deixado numa praia de Niterói e que, adotado, tornou-se um jovem suíço poliglota, baterista, formou-se Chef e trabalha num restaurante.
Na Suíça meu noivo fez o doutorado em física e pesquisas no acelerador de partículas que hoje é atração mundial. Fui uma grávida na Suíça, depois de casarmos na igreja e no cartório pelas leis suíças e brasileiras e de passar a lua de mel em Villar, nos Alpes. A caminho do trabalho, era comum escutar 10 línguas diferentes sendo faladas pelos passageiros do ônibus. Ficava admirada que um país tão pequeno tivesse 20% de estrangeiros (50 mil brasileiros) - mesma proporção encontrada na vila de 23 mil habitantes onde mora a brasileira atacada.
Foi o som das pessoas falando português do Brasil pelas ruas que me levou a descobrir os brasileiros de Lausanne, de Zurique, da Basiléia, de Lucerne, começando pela moradora do primeiro andar do meu prédio, que encontrei no elevador, vestida com um enorme casaco de pele branco, comentando seus negócios de venda do corpo com sua amiga, sem que soubesse que eu podia entender a sua língua. Mais tarde tirei até foto do despacho que ela colocava na janela de seu apartamento, produto de sua herança cultural.
Conheci e continuo conhecendo muitos brasileiros cada vez que vou à Suíça. Basta sentar na área de picnic de qualquer shopping para que apareçam as brasileiras com seus filhos nos carrinhos. A maioria são moças nordestinas casadas com suíços que visitaram o Brasil de férias. Nota-se que os casais, quase sempre, são de classes sociais distintas.
"A gaúcha Irene Zwetsch, coordenadora do CIGA-Brasil diz que, há brasileiras “que vêem para cá e casam num esquema meio rápido e depois constatam que não é bem aquilo”".
Convivi com algumas destas brasileiras cujos filhos nascidos na Suíça, em geral adaptam-se bem devido a escola, mas as mães enfrentam muitos problemas com a família do marido, seus amigos e com os vizinhos, pela incapacidade de entender o contexto cultural suíço devido à sua baixa escolaridade. A maioria fica restrita ao lar porque não tem qualificação para trabalhar. O isolamento pelo clima e pela falta de capacidade de comunicação leva à depressão e muitas voltam para o Brasil. Alguns maridos suíços até aprendem português e tentam se “abrasileirar” ou se transferem para o Brasil pelo bem das esposas.
“O brasileiro que chega à Suíça pela primeira vez para ficar, encontra mil pequenos problemas, a começar pela comunicação em um dos 3 idiomas oficiais do país (alemão, francês e italiano)e por não falar inglês.”
Pessoalmente, conheço poucos brasileiros morando na Suíça além dos meninos adotivos ou asilados. Acompanho pelo Orkut, os rapazes que estão lá estudando ou trabalhando e, em geral, elogiam o nível de desenvolvimento do país e como são tratados. Dentre as mulheres casadas, conheci muitas que são cristãs, conseguem construir uma família feliz e se adaptar através da participação na igreja. Vi um grande número de brasileiras presas a casamentos infelizes ou sobrevivendo como prostitutas ou em empregos simples. Muitas cristãs casadas prestam apoio material e emocional as brasileiras com problemas. A mesma necessidade sócio-econômica que trouxe as mulheres para a Suíça faz com que a comunidade brasileira se organize para sobreviver emocionalmente, porque na Suiça poucos vivem mal materialmente.
“Quem vive na Suíça, pode constatar, de fato, que os forasteiros – em particular os denominados “refugiados econômicos” – são vistos por uma parte da população, embora não se possa generalizar, como parasitas, como alguém que, por assim dizer, vem participar de um banquete para o qual não foi convidado”.
Paula Oliveira, que não tem este perfil social, ao ser atacada inocentemente, se destacou entre as brasileiras de Zurique, tornando-se um símbolo para os brasileiros que se sentem perseguidos nos países para onde migraram. Paula estudou em colégio particular, teve alimentação e assistência médica desde pequena, sempre morou bem e teve carro, não precisou casar-se com um estrangeiro em busca de um futuro melhor, não temia o racismo por ser branca, pensou que na Suíça escaparia da violência que a incomodava em seu país, experiência comum às outras brasileiras de Zurique e aos brasileiros daqui.
“O suíço tem em geral uma boa opinião do brasileiro: “Somos considerados bonzinhos. Não temos a pecha dos turcos, por exemplo, ou dos cidadãos procedentes do leste europeu”, diz Irene”.
Dentro da cultura brasileira “boazinha” - que torna os advogados mais “doutores” do que o Obama - e usando uma pitada da imaginação das novelas da globo, Paula, em seu infortúnio suíço, é a imagem idealizada de cidadã brasileira, com a qual nos identificamos em nossos sonhos, como se no Brasil todos fossem classe média, todos tivessem piscina, todos viajassem para Europa, todos comessem picanha (bem, isso até pode ser), todos tivessem diploma, todos tivessem tratamento médico decente, todos tivessem uma casa decente, todos tivessem um transporte público decente, todos tivessem LIBERDADE, todos tivessem voz, todos pudessem entrar em um shopping sem atrair olhares de reprovação, todos pudessem ir e vir (vide Niterói, a terra da lei da mão-única), todos fossem direto ao caixa sem ter que se submeter ao engodo da fila única e à humilhação da porta do banco, como se todos os homens, mulheres, crianças, animais e florestas do país fossem respeitados.
“Segundo a coordenadora, autoridades e líderes de vários setores da sociedade consideram os brasileiros “um dos grupos migrantes mais organizados da Suíça. Em todos os cantões importantes, como Berna, Genebra, Zurique e não apenas na Basiléia – onde está sediado o CIGA – a organização e atuação dos brasileiros é considerada boa”.
A realidade é que ao sofrer o ataque cruel, a moça pacata estava pagando pelos pecadores... Neste momento, enquanto a moça está no hospital cantonal em estado de choque, seus compatriotas unidos reclamam mundialmente da Suiça através da mídia. É como se de repente, para os brasileiros daqui e de lá, a Suíça tivesse virado São Gonçalo e o Brasil fosse o paraíso na terra.
“O presidente Lula reagiu indignado à agressão à brasileira. “O que nós queremos é que eles respeitem os brasileiros lá fora como nós os respeitamos aqui e como nós os tratamos bem aqui. Acho que não podemos aceitar e não podemos ficar calados diante de tamanha violência contra uma brasileira no exterior”, afirmou”.
Hoje cedo quando acordei, ainda pensando na reação do Brasil por causa da pobre da Paula, fiquei imaginando que tivesse sido transportada para outro planeta. Talvez tenha sido levada do Brasil para outra parte do universo, muito distante da terra, do continente de Hugo Chávez e Fidel, do país do PT, da “cidade (com mil favelas) maravilhosa” e do meu querido vizinho São Gonçalo, com seu Jardim Catarina, o maior bairro da América Latina, que no google earth parece uma grande favela horizontal com 240 mil habitantes. Tentando por a cabeça no lugar, preparei um café forte e liguei a TV, usando o controle para navegar entre os canais que apresentam notícias: morte, morte, morte, abuso, desrespeito, estorção, ladroagem, castelo de 25 milhões, cinismo, samba, samba, samba, pedofilia, tiros, droga, mulheres escravizdas, prostituição infantil, ataque a brasileira em Zurique...
“As críticas ao tratamento dado a Paula Oliveira pelas autoridades em Zurique podem levar o Brasil ao Alto Comissariado de Direitos Humanos das Nações Unidas”.
Reparo que, no caso de Paula o tom do noticiário muda. Agora o Brasil é um país sério. Ameaça retaliar. Não podemos aceitar, dizem os cidadãos em coro puxado pelo presidente. A Suiça tem que tratar os brasileiros tão bem quanto são tratados aqui. A polícia tem que resolver o crime tão rápido quanto é resolvido aqui (rsrsrsrs, começo a rir porque só pode ser piada). Os diplomatas exigem a aplicação dos direitos humanos igualzinho a como é feito por aqui. Os familiares da vítima usando o “sabe com quem tá falando” mobilizam os amigos-autoridades, os quais voam imediatamente para a Suíça (baratinho mesmo) para defender a brasileira, igualzinho como somos defendidos por aqui. Os brasileiros em Zurique despejam acusações contra a terrível Suíça para onde um dia resolveram emigrar, que não se compara com o Brasil perfeito que deixaram aqui. Eu mesma, revoltada, jogo fora metade do Nescafé (suíço) que estava tomando e me dirijo ao computador para blogar esta página.
Começo me perguntando, o que será que realmente motivou o ataque à brasileira? O ódio dos suíços contra os brasileiros que vivem em seu país? Seriam apenas três os vilões dessa história?
"Marcada à faca com as iniciais da SVP, a misteriosa agressão emocionou o Brasil", publicou o Le Temps de Genebra. A polícia de Zurique diz que "investiga em todas as direções" e faz um apelo para que possíveis testemunhas do crime se manifestem pelo telefone”.
Quando eu morava na Suíça aprendi que ali tudo e todos são controlados. Desde as flores nos canteiros das ruas até todos os estrangeiros que pensam que ninguém sabe o que eles fazem. Como não devia, não temia, por isso me sentia muito bem naquela sociedade. Aprendi o francês, o alemão e a fazer raclette e foundue. Adorava quando me diziam “Bonjour, Madame! Merci, Madame! Au-revoir, Madame!” Participava dos eventos locais, fazia trabalho voluntário, obedecia às leis (atravessar na faixa depois que o sinal fecha, por exemplo), vivia uma vida tranqüila e cultural, impensável no Brasil. Admirava os policiais por sua educação e competência, os motoristas de ônibus idem, os médicos idem (tive uma pedra nos rins), os cães que viajavam nos ônibus e trens de focinheira sem me atacar, os idosos por sua vitalidade e independência e passava muito tempo lendo sobre a história da confederação helvética CH(tenho um adesivo colado no carro IYCH).
O que eu não admirava era quando um conhecido telefonava para avisar que o orelhão da esquina estava dando linha direto para o Brasil e sugeria que eu tirasse vantagem disso como os outros brasileiros estavam fazendo, ligando para toda a família (naquela época era muito caro). Ou quando alguém vinha fazer doutorado pago pelo Brasil e acabava ficando, ao invés de voltar e pagar sua dívida social antes. Ou das mil e uma tramóias que via os brasileiros praticando, enquanto riam aquele sorrizinho típico dos irresponsáveis.
Na Suíça a própria população toma conta de seu país. Quando acontece um acidente de trânsito a polícia publica a foto e pede para quem tiver testemunhado a batida se apresentar para dar detalhes e confirmar as versões apresentadas. Quando alguém vê um carro com pneu careca dentro da garagem do vizinho, liga para a polícia e em poucos minutos o cidadão recebe a visita de um oficial que lhe aplica uma multa e um prazo para a troca. Todos os homens fazem parte do exército e seu fuzil, munição e uniforme ficam o tempo todo no armário de casa prontos para serem mobilizados a qualquer hora. Os jovens usam a palavra trabalho para os estudos. “Hoje tenho que trabalhar muito”. As crianças caminham sozinhas para o jardim de infância seguindo uma rota pelas ruas que lhes é ensinada no início do ano letivo. Os cães são treinados para não latirem o tempo todo. Assim que termina uma avalanche, todos os moradores do local saem à rua com pás e enxadas e em poucas horas tudo se normaliza. Depois das 10, ninguém lava louça, dá descarga, toca piano ou toma banho para não incomodar o vizinho. Quando é preciso fazer um reparo na casa, o dono deixa a porta destrancada para que a pessoa que foi contratada possa entrar, enquanto ele está no trabalho. Tudo isso é normal na Suíça, mas é muito para um brasileiro absorver e se adaptar.
“Irene conta que “conheço 18 grupos brasileiros em diferentes cantões, ativos em diferentes áreas, inclusive na área cultural. Isso não quer dizer que a imagem do brasileiro, e principalmente da brasileira, não precise ser retocada. Há certos preconceitos, clichês e estereótipos que devem ser combatidos. “Nosso problema é a prostituição”.O perfil que a mulher brasileira carrega na Suíça é a de mulher leviana”. Irene constata isso no dia-a-dia: “Se telefono a um homem e digo que sou brasileira, a imagem que ele tem de mim é a imagem da brasileira vendida pela mídia, a de que as brasileiras, em princípio, são mulheres fáceis. Todas, até prova em contrário”.
Os marginais suíços atacaram Paula, para agredir a todos nós e conseguiram. Paula era inocente e não merecia, ela acabou pagando pelos pecadores: por nós brasileiros, que vamos nos prostituir na Europa, que mesmo ganhando milhões jogando futebol não conseguimos ser um bom exemplo, que somos as garotas magrelas seminuas da Victoria Secret, que batemos recorde de assassinato urbano e violência no trânsito, que somos os maiores hackers do mundo, que destruímos a floresta mais preciosa do planeta, que desde a adolescência aprendemos a pegar coisas nas lojas e hotéis “de brincadeira”, que abandonamos nossas crianças e velhos, que ignoramos nossos deficientes físicos e que depois de tudo exigimos respeito. O mesmo respeito que Paula não teve dos criminosos e que a grande maioria dos brasileiros que vivem no Brasil nunca desfrutará durante toda sua vida. O respeito demonstrado por um salário digno, segurança alimentar, condições mínimas de moradia, acesso a educação de qualidade, saneamento básico e assistência social e médica condizentes.
O justo paga pelos pecadores. Não foram apenas três extremistas suíços que desrespeitaram a moça. O Brasil todo a desrespeitou. Paula pagou pela acomodação de milhões de indivíduos, diante da realidade de um país que não se dá ao respeito. A indignação brasileira é na verdade sentimento de culpa. Pela omissão ou pela corrupção de cada um. Paula simples foi mais uma inocente que pagou.
Como vivi em vários países estrangeiros, inclusive na Suíça, onde casei, trabalhei e tenho amigos que sempre visito, compartilho do sentimento nacional, apenas com uma visão mais objetiva do caso.
Morar num país cujo IDH está entre os 10 melhores do mundo é uma experiência marcante. Vou sempre a Zurique, conheço aquela estação de trem; conheço as cidadezinhas ao redor do lago; conheço muitos brasileiros que moram lá... Em Zurique, na sede da FIFA, será organizada a copa que os brasileiros tanto esperam. Para ali foi levado o único menino sobrevivente da chacina da Candelária que virou cidadão suiço. Foi num orfanato do Brasil que minha amiga suíça encontrou o menino negro de 6 anos que, recém-nascido, foi deixado numa praia de Niterói e que, adotado, tornou-se um jovem suíço poliglota, baterista, formou-se Chef e trabalha num restaurante.
Na Suíça meu noivo fez o doutorado em física e pesquisas no acelerador de partículas que hoje é atração mundial. Fui uma grávida na Suíça, depois de casarmos na igreja e no cartório pelas leis suíças e brasileiras e de passar a lua de mel em Villar, nos Alpes. A caminho do trabalho, era comum escutar 10 línguas diferentes sendo faladas pelos passageiros do ônibus. Ficava admirada que um país tão pequeno tivesse 20% de estrangeiros (50 mil brasileiros) - mesma proporção encontrada na vila de 23 mil habitantes onde mora a brasileira atacada.
Foi o som das pessoas falando português do Brasil pelas ruas que me levou a descobrir os brasileiros de Lausanne, de Zurique, da Basiléia, de Lucerne, começando pela moradora do primeiro andar do meu prédio, que encontrei no elevador, vestida com um enorme casaco de pele branco, comentando seus negócios de venda do corpo com sua amiga, sem que soubesse que eu podia entender a sua língua. Mais tarde tirei até foto do despacho que ela colocava na janela de seu apartamento, produto de sua herança cultural.
Conheci e continuo conhecendo muitos brasileiros cada vez que vou à Suíça. Basta sentar na área de picnic de qualquer shopping para que apareçam as brasileiras com seus filhos nos carrinhos. A maioria são moças nordestinas casadas com suíços que visitaram o Brasil de férias. Nota-se que os casais, quase sempre, são de classes sociais distintas.
"A gaúcha Irene Zwetsch, coordenadora do CIGA-Brasil diz que, há brasileiras “que vêem para cá e casam num esquema meio rápido e depois constatam que não é bem aquilo”".
Convivi com algumas destas brasileiras cujos filhos nascidos na Suíça, em geral adaptam-se bem devido a escola, mas as mães enfrentam muitos problemas com a família do marido, seus amigos e com os vizinhos, pela incapacidade de entender o contexto cultural suíço devido à sua baixa escolaridade. A maioria fica restrita ao lar porque não tem qualificação para trabalhar. O isolamento pelo clima e pela falta de capacidade de comunicação leva à depressão e muitas voltam para o Brasil. Alguns maridos suíços até aprendem português e tentam se “abrasileirar” ou se transferem para o Brasil pelo bem das esposas.
“O brasileiro que chega à Suíça pela primeira vez para ficar, encontra mil pequenos problemas, a começar pela comunicação em um dos 3 idiomas oficiais do país (alemão, francês e italiano)e por não falar inglês.”
Pessoalmente, conheço poucos brasileiros morando na Suíça além dos meninos adotivos ou asilados. Acompanho pelo Orkut, os rapazes que estão lá estudando ou trabalhando e, em geral, elogiam o nível de desenvolvimento do país e como são tratados. Dentre as mulheres casadas, conheci muitas que são cristãs, conseguem construir uma família feliz e se adaptar através da participação na igreja. Vi um grande número de brasileiras presas a casamentos infelizes ou sobrevivendo como prostitutas ou em empregos simples. Muitas cristãs casadas prestam apoio material e emocional as brasileiras com problemas. A mesma necessidade sócio-econômica que trouxe as mulheres para a Suíça faz com que a comunidade brasileira se organize para sobreviver emocionalmente, porque na Suiça poucos vivem mal materialmente.
“Quem vive na Suíça, pode constatar, de fato, que os forasteiros – em particular os denominados “refugiados econômicos” – são vistos por uma parte da população, embora não se possa generalizar, como parasitas, como alguém que, por assim dizer, vem participar de um banquete para o qual não foi convidado”.
Paula Oliveira, que não tem este perfil social, ao ser atacada inocentemente, se destacou entre as brasileiras de Zurique, tornando-se um símbolo para os brasileiros que se sentem perseguidos nos países para onde migraram. Paula estudou em colégio particular, teve alimentação e assistência médica desde pequena, sempre morou bem e teve carro, não precisou casar-se com um estrangeiro em busca de um futuro melhor, não temia o racismo por ser branca, pensou que na Suíça escaparia da violência que a incomodava em seu país, experiência comum às outras brasileiras de Zurique e aos brasileiros daqui.
“O suíço tem em geral uma boa opinião do brasileiro: “Somos considerados bonzinhos. Não temos a pecha dos turcos, por exemplo, ou dos cidadãos procedentes do leste europeu”, diz Irene”.
Dentro da cultura brasileira “boazinha” - que torna os advogados mais “doutores” do que o Obama - e usando uma pitada da imaginação das novelas da globo, Paula, em seu infortúnio suíço, é a imagem idealizada de cidadã brasileira, com a qual nos identificamos em nossos sonhos, como se no Brasil todos fossem classe média, todos tivessem piscina, todos viajassem para Europa, todos comessem picanha (bem, isso até pode ser), todos tivessem diploma, todos tivessem tratamento médico decente, todos tivessem uma casa decente, todos tivessem um transporte público decente, todos tivessem LIBERDADE, todos tivessem voz, todos pudessem entrar em um shopping sem atrair olhares de reprovação, todos pudessem ir e vir (vide Niterói, a terra da lei da mão-única), todos fossem direto ao caixa sem ter que se submeter ao engodo da fila única e à humilhação da porta do banco, como se todos os homens, mulheres, crianças, animais e florestas do país fossem respeitados.
“Segundo a coordenadora, autoridades e líderes de vários setores da sociedade consideram os brasileiros “um dos grupos migrantes mais organizados da Suíça. Em todos os cantões importantes, como Berna, Genebra, Zurique e não apenas na Basiléia – onde está sediado o CIGA – a organização e atuação dos brasileiros é considerada boa”.
A realidade é que ao sofrer o ataque cruel, a moça pacata estava pagando pelos pecadores... Neste momento, enquanto a moça está no hospital cantonal em estado de choque, seus compatriotas unidos reclamam mundialmente da Suiça através da mídia. É como se de repente, para os brasileiros daqui e de lá, a Suíça tivesse virado São Gonçalo e o Brasil fosse o paraíso na terra.
“O presidente Lula reagiu indignado à agressão à brasileira. “O que nós queremos é que eles respeitem os brasileiros lá fora como nós os respeitamos aqui e como nós os tratamos bem aqui. Acho que não podemos aceitar e não podemos ficar calados diante de tamanha violência contra uma brasileira no exterior”, afirmou”.
Hoje cedo quando acordei, ainda pensando na reação do Brasil por causa da pobre da Paula, fiquei imaginando que tivesse sido transportada para outro planeta. Talvez tenha sido levada do Brasil para outra parte do universo, muito distante da terra, do continente de Hugo Chávez e Fidel, do país do PT, da “cidade (com mil favelas) maravilhosa” e do meu querido vizinho São Gonçalo, com seu Jardim Catarina, o maior bairro da América Latina, que no google earth parece uma grande favela horizontal com 240 mil habitantes. Tentando por a cabeça no lugar, preparei um café forte e liguei a TV, usando o controle para navegar entre os canais que apresentam notícias: morte, morte, morte, abuso, desrespeito, estorção, ladroagem, castelo de 25 milhões, cinismo, samba, samba, samba, pedofilia, tiros, droga, mulheres escravizdas, prostituição infantil, ataque a brasileira em Zurique...
“As críticas ao tratamento dado a Paula Oliveira pelas autoridades em Zurique podem levar o Brasil ao Alto Comissariado de Direitos Humanos das Nações Unidas”.
Reparo que, no caso de Paula o tom do noticiário muda. Agora o Brasil é um país sério. Ameaça retaliar. Não podemos aceitar, dizem os cidadãos em coro puxado pelo presidente. A Suiça tem que tratar os brasileiros tão bem quanto são tratados aqui. A polícia tem que resolver o crime tão rápido quanto é resolvido aqui (rsrsrsrs, começo a rir porque só pode ser piada). Os diplomatas exigem a aplicação dos direitos humanos igualzinho a como é feito por aqui. Os familiares da vítima usando o “sabe com quem tá falando” mobilizam os amigos-autoridades, os quais voam imediatamente para a Suíça (baratinho mesmo) para defender a brasileira, igualzinho como somos defendidos por aqui. Os brasileiros em Zurique despejam acusações contra a terrível Suíça para onde um dia resolveram emigrar, que não se compara com o Brasil perfeito que deixaram aqui. Eu mesma, revoltada, jogo fora metade do Nescafé (suíço) que estava tomando e me dirijo ao computador para blogar esta página.
Começo me perguntando, o que será que realmente motivou o ataque à brasileira? O ódio dos suíços contra os brasileiros que vivem em seu país? Seriam apenas três os vilões dessa história?
"Marcada à faca com as iniciais da SVP, a misteriosa agressão emocionou o Brasil", publicou o Le Temps de Genebra. A polícia de Zurique diz que "investiga em todas as direções" e faz um apelo para que possíveis testemunhas do crime se manifestem pelo telefone”.
Quando eu morava na Suíça aprendi que ali tudo e todos são controlados. Desde as flores nos canteiros das ruas até todos os estrangeiros que pensam que ninguém sabe o que eles fazem. Como não devia, não temia, por isso me sentia muito bem naquela sociedade. Aprendi o francês, o alemão e a fazer raclette e foundue. Adorava quando me diziam “Bonjour, Madame! Merci, Madame! Au-revoir, Madame!” Participava dos eventos locais, fazia trabalho voluntário, obedecia às leis (atravessar na faixa depois que o sinal fecha, por exemplo), vivia uma vida tranqüila e cultural, impensável no Brasil. Admirava os policiais por sua educação e competência, os motoristas de ônibus idem, os médicos idem (tive uma pedra nos rins), os cães que viajavam nos ônibus e trens de focinheira sem me atacar, os idosos por sua vitalidade e independência e passava muito tempo lendo sobre a história da confederação helvética CH(tenho um adesivo colado no carro IYCH).
O que eu não admirava era quando um conhecido telefonava para avisar que o orelhão da esquina estava dando linha direto para o Brasil e sugeria que eu tirasse vantagem disso como os outros brasileiros estavam fazendo, ligando para toda a família (naquela época era muito caro). Ou quando alguém vinha fazer doutorado pago pelo Brasil e acabava ficando, ao invés de voltar e pagar sua dívida social antes. Ou das mil e uma tramóias que via os brasileiros praticando, enquanto riam aquele sorrizinho típico dos irresponsáveis.
Na Suíça a própria população toma conta de seu país. Quando acontece um acidente de trânsito a polícia publica a foto e pede para quem tiver testemunhado a batida se apresentar para dar detalhes e confirmar as versões apresentadas. Quando alguém vê um carro com pneu careca dentro da garagem do vizinho, liga para a polícia e em poucos minutos o cidadão recebe a visita de um oficial que lhe aplica uma multa e um prazo para a troca. Todos os homens fazem parte do exército e seu fuzil, munição e uniforme ficam o tempo todo no armário de casa prontos para serem mobilizados a qualquer hora. Os jovens usam a palavra trabalho para os estudos. “Hoje tenho que trabalhar muito”. As crianças caminham sozinhas para o jardim de infância seguindo uma rota pelas ruas que lhes é ensinada no início do ano letivo. Os cães são treinados para não latirem o tempo todo. Assim que termina uma avalanche, todos os moradores do local saem à rua com pás e enxadas e em poucas horas tudo se normaliza. Depois das 10, ninguém lava louça, dá descarga, toca piano ou toma banho para não incomodar o vizinho. Quando é preciso fazer um reparo na casa, o dono deixa a porta destrancada para que a pessoa que foi contratada possa entrar, enquanto ele está no trabalho. Tudo isso é normal na Suíça, mas é muito para um brasileiro absorver e se adaptar.
“Irene conta que “conheço 18 grupos brasileiros em diferentes cantões, ativos em diferentes áreas, inclusive na área cultural. Isso não quer dizer que a imagem do brasileiro, e principalmente da brasileira, não precise ser retocada. Há certos preconceitos, clichês e estereótipos que devem ser combatidos. “Nosso problema é a prostituição”.O perfil que a mulher brasileira carrega na Suíça é a de mulher leviana”. Irene constata isso no dia-a-dia: “Se telefono a um homem e digo que sou brasileira, a imagem que ele tem de mim é a imagem da brasileira vendida pela mídia, a de que as brasileiras, em princípio, são mulheres fáceis. Todas, até prova em contrário”.
Os marginais suíços atacaram Paula, para agredir a todos nós e conseguiram. Paula era inocente e não merecia, ela acabou pagando pelos pecadores: por nós brasileiros, que vamos nos prostituir na Europa, que mesmo ganhando milhões jogando futebol não conseguimos ser um bom exemplo, que somos as garotas magrelas seminuas da Victoria Secret, que batemos recorde de assassinato urbano e violência no trânsito, que somos os maiores hackers do mundo, que destruímos a floresta mais preciosa do planeta, que desde a adolescência aprendemos a pegar coisas nas lojas e hotéis “de brincadeira”, que abandonamos nossas crianças e velhos, que ignoramos nossos deficientes físicos e que depois de tudo exigimos respeito. O mesmo respeito que Paula não teve dos criminosos e que a grande maioria dos brasileiros que vivem no Brasil nunca desfrutará durante toda sua vida. O respeito demonstrado por um salário digno, segurança alimentar, condições mínimas de moradia, acesso a educação de qualidade, saneamento básico e assistência social e médica condizentes.
O justo paga pelos pecadores. Não foram apenas três extremistas suíços que desrespeitaram a moça. O Brasil todo a desrespeitou. Paula pagou pela acomodação de milhões de indivíduos, diante da realidade de um país que não se dá ao respeito. A indignação brasileira é na verdade sentimento de culpa. Pela omissão ou pela corrupção de cada um. Paula simples foi mais uma inocente que pagou.
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